sexta-feira, 8 de março de 2019

“SE A RUA BEALE FALASSE” (“IF BEALE STREET COULD TALK”), 2018, EUA, 120 minutos, dirigido por Barry Jenkins, que também escreveu o roteiro baseado no romance de James Baldwin lançado em 1974. As famílias de Tish (Kiki Laine) e de Alonzo “Fonny” Hunt (Stephan James) são vizinhas no Harlem. Tish e Fonny cresceram juntos e ainda adolescentes engatam um namoro. A história é ambientada no início dos anos 70, quando Tish está com 19 anos e Fonny com 22. Continuam apaixonados e ela acaba engravidando. Só que um dia Fonny é preso, acusado de estuprar uma jovem porto-riquenha. Ele nega o crime, mas o fato de ser negro já supõe culpa no país racista do Tio Sam, ainda mais naquela época. Tish acredita na inocência do namorado e segue sonhando em ter um lar no futuro com filhos etc. Mas nem sempre os sonhos tornam-se realidade, principalmente para uma minoria segregada. Barry Jenkins fez uma boa adaptação de um dos mais conhecidos romances de James Baldwin, autor também negro que explora, na maioria dos seus livros, a questão racial nos Estados Unidos. Lembro que Jenkins também foi o diretor do poderoso “Moonlight: Sob a Luz do Luar”, Melhor Filme do Oscar 2017. Por falar em Oscar, “Se a Rua Beale Falasse” foi indicado para três categorias na versão 2019: Atriz Coadjuvante, Roteiro Adaptado e Trilha Sonora. Só levou o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante, Regina King, que faz a mãe de Tish. Achei que houve injustiça com Kiki Laine, que deveria ter sido indicada para Melhor Atriz e não foi. Ela está ótima. Enfim, “Se a Rua Beale Falasse” é mais um excelente filme da safra 2018, que já nos deu “Green Book”, “A Favorita” e “Bohemian Rhapsody”, entre outros.   

quarta-feira, 6 de março de 2019


“DEDE”, 2017, Georgia, 97 minutos, primeiro longa-metragem dirigido pela diretora Mariam Khatchvani, com roteiro de Vova Kacharava e Irakli Solomonashvili. Esse drama pesado, não fosse georgiano, seria um legítimo drama mexicano. Tem muita tragédia, brigas de famílias que geralmente terminam em morte, casamentos arranjados, mulheres e homens infelizes, pobreza... e por aí afora, sem contar com os cenários de muita neve e um frio de congelar os ossos. A história é toda ambientada em 1992 – logo após a guerra da independência - num vilarejo remoto na zona rural e montanhosa do interior da Geórgia, ex-república soviética. Num arranjo entre as respectivas famílias, a jovem Dina (Nadia Vibliani) está prometida em casamento para um homem que ela não ama. O preferido dela é o jovem Gegi (George Babluani), que por uma infelicidade é amigo do noivo. Dina desmarca o casamento, gerando uma guerra entre as famílias. É nesse contexto dramático que a trama segue até o seu desfecho. O mais interessante desse ótimo drama georgiano é o destaque dado às tradições locais, a principal delas o papel sempre subserviente e humilhante destinado às mulheres. Com exceção de três ou quatro atores profissionais, o restante do elenco é todo constituído por pessoas do próprio vilarejo, o que dá ao filme uma autenticidade e um realismo especiais. Só para lembrar, a Geórgia é um país da Europa Oriental que faz fronteira com Azerbaijão, Armênia e Turquia. A língua oficial é a suana, falada também no filme. Resumo da ópera: “Dede” é excelente. Assisti-lo é uma ótima oportunidade para conhecer um pouco do pouco conhecido cinema georgiano. Para concluir: o filme estreou no Festival Internacional de Cinema de Karlovy  Vary, na República Tcheca, com muitos elogios da crítica e do público.   

terça-feira, 5 de março de 2019


“COLETTE”, 2018, coprodução EUA/Inglaterra, 1h52m, roteiro de Richard Glatzer e Rebecca Lenkiewicz, com direção de Wash Westmoreland. Trata-se de um filme biográfico que acompanha a trajetória fascinante da romancista francesa Sidonie-Gabrielle Colette, mais conhecida apenas como Colette, que no início do século XX foi um grande sucesso de vendas com suas histórias apimentadas, recheadas de sexo com a personagem Claudine. A sociedade conservadora ficou escandalizada com os temas abordados por Colette. Jovem simples nascida no interior da França, ela foi pedida em casamento pelo então famoso escritor Willy (Dominic West), cujos livros, na verdade, eram escritos por jovens escritores em início de carreira (escritores-fantasmas). Willy só assinava como autor. Colette começou a escrever alguns romances que também seriam assinados por Willy. Anos mais tarde, se cansaria dessa situação, assumindo a autoria, com seu próprio nome, de outros romances, todos sucessos de vendas na época. Em sua vida pessoal, Colette se envolveria sexualmente também com outras mulheres, entre as quais a aristocrata norte-americana George Raoul-Duval (Eleonor Tomlinson) e a atriz de teatro Missy (Denise Gough), romances que seriam descritos em seus livros. Ou seja, para usar um clichê dos mais antigos, Colette era uma mulher à frente do seu tempo. Além de bonita, Keira Knightley é ótima atriz e vários diretores adoram colocá-la em filmes de época, como aconteceu em “Orgulho e Preconceito” e “Desejo e Reparação”, entre tantos outros. Exibido por aqui na programação oficial do Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, em novembro de 2018, “Colette” é um filme de muita qualidade, com um elenco dos melhores, uma excelente fotografia e uma primorosa reconstituição de época.   

segunda-feira, 4 de março de 2019


“O QUE AS PESSOAS VÃO DIZER” (“HVA VIL FOLK SI”, título original em norueguês, e “What Will People Say” nos países de língua inglesa), 2018, Noruega, 1h46m, roteiro e direção da norueguesa Iram Haq (seu segundo longa-metragem). O filme foi selecionado para representar a Noruega na disputa do Oscar 2019 de Melhor Filme, mas não emplacou, embora seja ótimo. Trata-se de um drama cujo pano de fundo é o radicalismo paterno, comum entre as famílias muçulmanas. A história é centrada na jovem Nisha (Maria Mozhdah), nascida e criada em Oslo, capital da Noruega. Aos 16 anos, ela vai a baladas, namora, fuma um baseado de vez em quando, enfim, tudo o que uma garota ocidental está acostumada a fazer. Nisha faz tudo isso bem escondida dos pais imigrantes paquistaneses, Mirza (Adil Hussain) e Najma (Ekavali Khanna), radicais à beira do fundamentalismo quanto às tradições culturais e religiosas de seu país de origem. Quando Nisha é surpreendida com o namorado nas preliminares, seu Mirza acaba espancando o rapaz. O caso termina na delegacia. Najma, a mãe, se desespera: “O que os outros vão dizer?”. Essa preocupação diz respeito, claro, à reputação não só de Nisha, mas de toda a sua família. Depois disso, o pai, num acesso de ódio, decide levar a filha à força para Islamabad (capital do Paquistão), para a casa de sua irmã. Nisha tenta se adaptar aos costumes da família, mas acaba se envolvendo com um primo. Aí a coisa piora de vez. Nisha é obrigada a voltar para Oslo, onde curtirá mais alguns momentos de infelicidade. A gota d’água acontece quando a família arranja um marido paquistanês residente no Canadá para casar com Nisha. O filme, falado em norueguês e urdu, é muito bom e impactante, apresentando uma realidade presente há séculos nas famílias muçulmanas, onde a mulher é desconsiderada como cidadã. Filmaço!  

domingo, 3 de março de 2019


“GREEN BOOK: O GUIA” (“Green Book”), 2018, EUA, 2h10m, roteiro e direção de Peter Farrelly. Antes de assistir a esta pérola, vi “Bohemian Raphsody” e “A Favorita”, outros dois fortes concorrentes ao Oscar 2019 de Melhor Filme. Achei que um desses dois ganharia o prêmio. Se tivesse visto “Green Book” antes da noite da premiação, apostaria nele todas as minhas fichas. Sem dúvida, um filme maravilhoso, sensível, divertido, enfim, cinema da melhor qualidade. O trunfo maior, porém, além da interessante história baseada em fatos reais, é a dupla de atores Viggo Mortensen e Mahershala Ali. Eles interpretam, respectivamente, o grosseirão Frank “Toni Lip” Vallelonga e o refinado pianista Don Shirley. O filme é ambientado em 1962 – a reconstituição da época é sensacional. Toni Lip trabalhava como segurança na discoteca Copacabana, em Nova Iorque. Quando o estabelecimento fechou para reformas, que durariam mais ou menos três meses, Toni arrumou um “bico” de motorista, assistente e segurança do pianista Don Shirley, um dos mais conceituados músicos de jazz que fazia enorme sucesso com seu “Trio Don Shirley”. Shirley e seu grupo foram contratados para uma turnê em várias cidades do sul, a região mais racista do país. O gozado da situação é que Toni Lip era um racista convicto e que seria obrigado a ter um chefe negro. É desse contexto que Farrelly conseguiu criar as mais hilariantes situações, principalmente no que se refere aos diálogos entre o motorista e seu chefe. Desta vez, Peter não trabalhou com seu irmão Bob, conhecidos como os irmãos Farrelly, responsáveis por ótimas comédias como “Debi & Lóide – Dois Idiotas em Apuros”, “Eu, Eu Mesmo & Irene” e “Quem vai Ficar com Mary?”. Além de dirigir “Green Book”, Peter escreveu o roteiro juntamente com Nick Vallelonga (filho de Toni na vida real) e Brian Hayes Currie. Por seu trabalho em “Green Book”, Mahershala Ali conquistou o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante. Merecido. Viggo Mortensen concorreu a Melhor Ator, perdendo para Rami Malek, o Fred Mercury de “Bohemian Raphsody”. Mortensen era o grande favorito, pois antes do Oscar já havia sido premiado pela AACTA Internacional Award, pelo Critic’s Choise Award, pelo Bafta, Sindicato dos Atores e pelo Globo de Ouro. Sua atuação é mesmo fantástica. Ele chegou a engordar 20 quilos para interpretar Toni. Como informação adicional, lembro que o Green Book era um livro/guia de hotéis e restaurantes do sul dos EUA que aceitavam afrodescendentes. Quem ainda não assistiu está perdendo a oportunidade de conhecer um dos melhores filmes dos últimos anos. Imperdível!