sábado, 28 de março de 2020


“LUCE”, 2019, EUA, 1h49m, roteiro e direção de Julius Onah, cineasta nigeriano radicado nos Estados Unidos. É o terceiro longa-metragem de sua carreira. Para escrever o roteiro, Julius teve como inspiração a peça teatral escrita por J.C. Lee, que também colaborou no filme. Trata-se de um suspense psicológico centrado no jovem Luce Edgar (Kelvin Harrison Jr.), um ídolo em sua escola, admirado por alunos e professores, além de orador oficial da turma nos principais eventos do colégio. Ele havia sido adotado quando tinha 7 anos, trazido da Eritreia – país da África Oriental - pelo casal Peter (Tim Roth) e Amy Edgar (Naomi Watts). Acontece que Luce, por suas reações contraditórias, tinha a desconfiança da professora Harriet Wilson (Octavia Spencer). Como se não bastasse, ela acabaria encontrando no armário do rapaz um artigo político incitando à violência como forma de resolver conflitos. Além disso, havia um pacote com fogos de artifício. As situações levam a crer que Luce não era um jovem perfeito, aquele anjo que parecia ser, mas que tinha um lado obscuro, aspecto que sua mãe protetora jamais acreditaria. A situação cria um mal estar entre Luce e a professora, envolvendo os pais do rapaz e a direção da escola. Nesse sentido, o trabalho dos atores valoriza o clima tenso que vai do começo ao fim do filme. Destaque especial para a interpretação magistral do jovem ator Kelvin Harrison Jr., de apenas 25 anos, e também da sempre espetacular Octavia Spencer, que tem um Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por “Histórias Cruzadas” (2012). Naomi Watts também está ótima como a mãe superprotetora que não vê defeitos no filho. E, finalmente, Tim Roth, com uma atuação mais contida, mas mesmo assim excelente. A estreia mundial de “Luce” aconteceu no Festival de Cinema Independente de Sundance, onde foi o filme mais comentado, recebendo elogios entusiasmados. Também ganhou 94% de aprovação no site “Rotten Tomates”, uma porcentagem difícil de alcançar. Enfim, “Luce” é uma verdadeira aula de cinema, ou como fazer com que o espectador não desgrude os olhos da tela. Sensacional!   

sexta-feira, 27 de março de 2020


“A NATUREZA DO TEMPO” (“EN ATTENDANT LES HIROLDELLES”), 2018, coprodução França/Argélia, 1h55m, primeiro longa-metragem escrito e dirigido pelo cineasta argelino Karim Moussaoui. São três histórias dentro do filme. Na primeira, Mourad (Mohamed Djouhri), um investidor do ramo imobiliário, enfrenta problemas com o filho, que pretende abandonar a faculdade de medicina perto da formatura. Na segunda, o jovem Djalil (Mehdi Ramdani) é contratado como motorista para levar Aicha (Hania Amar) e seus pais à cidade do noivo para os preparativos do casamento. Na terceira e última história, um médico neurologista (Hassan Kachach) é procurado por uma mulher que o acusa de tê-la estuprado. No meio de cada história, o roteiro inventa várias situações envolvendo os personagens, o que de certa forma consegue tornar o filme um pouco mais dinâmico. Uma boa sacada do roteiro é promover o encontro casual de personagens de uma história e das outras perto do desfecho. Ao fim da terceira história, a do médico acusado de estupro, aparece um homem misterioso cuja identidade não é revelada. Sua aparição cai no vazio , deixando o espectador com cara de Ué? No geral, o filme é lento demais, entediante, mas interessante sob o ponto de vista do cotidiano da sociedade argelina. Os cenários são áridos, o vento levantando areia para todos os lados, e as ruas são mostradas com ruínas que parecem resultado de alguma guerra. Cenários de total desolação. “A Natureza do Tempo” concorreu a melhor filme na Mostra “Um Certain Regard” do Festival de Cannes. Indicado somente para cinéfilos ou espectadores interessados em conhecer os bastidores da vida na Argélia.    

quinta-feira, 26 de março de 2020


“OS AERONAUTAS” (“THE AERONAUTS”), 2019, Inglaterra, produção Amazon Prime, 1h41m, direção de Tom Harper, que também assina o roteiro juntamente com Jack Thorne. A história, baseada em fatos reais, foi inspirada no livro “Falling Up Wards: How We Took to the Air”, de Richard Holmes, que relembra a sensacional aventura de um cientista e uma balonista (personagem fictício, que explico no final deste comentário). O filme é ambientado no ano de 1862 em Londres. O cientista James Glaisher associou-se à famosa balonista Amelia Wren (Felicity Jones) para um voo muito especial: pesquisar formas de se prever a meteorologia. Enfrentando chuva torrencial, temporais, raios, frio de congelar e muita ventania, a dupla conseguiu, além da pesquisa em si, bater o recorde de altura da época: 8.700 quilômetros. No filme, a personagem Amelia Wren foi criada à vontade do roteirista e do diretor. Na verdade, o verdadeiro companheiro de Glaisher na missão foi o também cientista Henry Coxell. Amelia Wren surgiu inspirada em uma balonista muito famosa na época, Sophie Blanchard. Com relação a  James Glaisher, o cientista foi uma figura muito importante no mundo científico, sendo pesquisador do departamento de Meteorologia do Observatório Real de Grenwich e fundador da Sociedade Real de Meteorologia e da Sociedade Aeronáutica da Grã-Bretanha. O filme é espetacular, com cenas de perigo de tirar o fôlego. A gente acompanha tudo de muito perto, como se estivesse no balão. Méritos para o diretor Tom Harper, que soube manter um ritmo frenético deste o início até o desfecho, valorizando aquela que foi uma das aventuras mais espetaculares que o cinema já produziu. Também estão no elenco Vincent Perez, Tom Courtnay, Himesh Patel, Rebecca Front e Anne Reid. Relembro que Eddie Redmayne e Felicity Jones trabalharam juntos em “A Teoria de Tudo” (2014), filme que resultou no Oscar de Melhor Ator para Redmayne, que viveu o físico inglês Stephen Hawking. No caso de “Os Aeronautas”, porém, o destaque maior fica para a dentucinha Felicity Jones, que arrasa principalmente nas cenas de ação. IMPERDÍVEL!          

quarta-feira, 25 de março de 2020


“MINHA OBRA-PRIMA” (“MI OBRA MAESTRA”), 2018, Argentina, 1h45m, roteiro e direção de Gaston Duprat. Mais um filme argentino para dar inveja a nosotros. Trata-se de uma divertida e inteligente comédia reunindo dois dos mais consagrados atores do país de Maradona: Guillermo Francella e Luis Brandoni. Guillermo é Arturo Silva, um conhecido marchand e galerista de Buenos Aires. Brandoni é Renzo Nervi, um pintor que fez grande sucesso na década de 80, mas agora não consegue vender mais nada. E, pior, virou um artista carrancudo, mal-humorado, insuportável e difícil de se lidar. E, além do mais, falido. Mesmo com a decadência do pintor, Arturo jamais abandonou o amigo de muitos anos, que o ajudou a ganhar muito dinheiro. Agora, porém, Arturo está tendo enorme dificuldade de ajudar Nervi, principalmente devido ao seu comportamento antissocial. Quando um acidente ocorre com o pintor, obrigando-o a ser internado, Arturo vê uma ótima possibilidade de reverter o quadro de penúria do amigo e também ganhar dinheiro com isso. Eles bolam um plano macabro para valorizar os quadros de Nervi, que assinou um documento doando-os ao marchand. Tudo caminha bem até que um ex-aluno de Nervi, Alex (Raul Arévalo), meio que sem querer, descobre um segredo que abalará o mercado das artes na Argentina. Graças ao roteiro elaborado por Duprat, o filme diverte muito com seu humor corrosivo, que no fundo é uma sátira ao mundo das artes. Mas seu maior trunfo é, sem dúvida, o trabalho magistral dos atores Francella e Brandoni, que conseguem transformar seus personagens em figuras simpáticas e cativantes. Eu já conhecia Francella dos filmes “Coração de Leão – O Amor não tem Tamanho”, “Um Namorado para Minha Esposa” e do espetacular “O Segredo dos seus Olhos”. Aos 79 anos, Brandoni é um dos mais conhecidos atores argentinos, mas confesso que não lembro de tê-lo visto em algum filme. Com relação ao roteirista e diretor Gastón Duprat, lembro de dois de seus filmes, “O Homem ao Lado” e “O Cidadão Ilustre", ambos muito bons. “Minha Obra-Prima” é mais um filmaço argentino. Imperdível!          

segunda-feira, 23 de março de 2020


“SALYUT–7: MISSÃO ESPACIAL” (“SALYUT–7”), 2017, Rússia, 120 minutos, roteiro e direção de Klim Shipenko. A história é centrada na missão Salyut-7, que em 1985 enviou dois cosmonautas para o espaço na nave Soyuz com o objetivo de recuperar uma estação orbital morta. O resultado final foi um gol de placa dos russos, que pela primeira vez na história das missões espaciais - incluindo os norte-americanos - conseguiram acoplar e trazer a estação de volta ao serviço. Um ato heroico que exigiu muita coragem por parte da dupla de astronautas. Vicktor (Pavel Derevyanko) e Vladimir (Vladimir Vdovichenkov) eram os astronautas mais experientes e bem e preparados para a difícil missão. Da Terra, na sede da Roscosmos (agência espacial russa equivalente à Nasa), o diretor Valery Ryumin (Aleksander Samoylenko) e sua equipe monitoravam os trabalhos. O filme tem momentos de muita tensão, incluindo a agonia das esposas dos cosmonautas, uma delas grávida, um dos clichês mais utilizados em filmes do gênero, embora “Salyut-7” seja baseado em fatos reais. A gente acompanha na maior tensão a rotina perigosa dos astronautas, a cada dia encontrando pela frente situações de alto risco, e o drama vivido pela equipe de Valery, obrigada a tomar decisões em minutos nos momentos mais cruciais. Como não poderia deixar de ser, o êxito da missão é exaltado no filme de forma bem patriótica, coisa que o pessoal de Hollywood cansa de fazer. “Salyut-7” é um dos melhores filmes que assisti sobre eventos espaciais. Recomendo sem pestanejar.     


“UM ROMANCE NAS ENTRELINHAS” (“VITA & VIRGINIA”), 2018, Irlanda, 1h50m, segundo longa-metragem dirigido pela jovem cineasta inglesa Chanya Button, de 33 anos. O roteiro foi escrito pela atriz, romancista e dramaturga Eileen Atkins, autora do livro “Vita & Virginia” e da peça teatral do mesmo nome. A história é inspirada num acontecimento ocorrido no início dos anos 20 do século passado, ou seja, o escandaloso romance entre a já consagrada escritora inglesa Virginia Woolf (Elizabeth Debicki) e a aristocrata Vita Sackville (Gemma Arterton), também escritora e grande admiradora de Virginia. Ambas eram casadas, Virginia com Leonard Woolf, editor e dono de uma gráfica. Vita era casada com sir Harold Nicolson (Rupert Penay-Jones), um dos diplomatas mais importantes do governo inglês. Na verdade, Vita tinha um casamento de fachada, já que Nicolson era homossexual. O romance entre as duas mulheres começa com o assédio de Vita. Virginia, de início, acha que Vita é apenas uma fã ardorosa, mas logo percebe que se trata de uma paixão de verdade. O roteiro do filme destaca a troca de cartas e poemas entre as amantes, lidas pelas próprias protagonistas em frente da câmera. São momentos de tédio para o espectador. Além disso, os diálogos são de um inglês empolado, extremamente pomposo, que chega a incomodar. Não que prejudiquem o filme, mas que são entediantes, são sim. Vale lembrar que Vita serviu de inspiração para Virginia criar o personagem principal do livro “Orlando: Uma Biografia”, considerado o maior clássico da literatura feminista do Século XX. Devo destacar como trunfos do filme a primorosa ambientação de época, principalmente com relação aos figurinos e cenários, e a fotografia, além da competente atuação de Gemma Arterton e Elizabeth Debicki, duas ótimas atrizes. Outro destaque do elenco é a participação de Isabella Rossellini como a baronesa Sackville, mãe de Vita. Enfim, não é um filme para o público em geral, só para aqueles que curtem literatura e são fãs de Virginia Woolf.