sexta-feira, 7 de agosto de 2020

 

O CERCO DE JADOTVILLE (The Siege of Jadotville), 2016, Irlanda, 1h46m, longa de estreia na direção de Richie Smyth, mais conhecido como diretor de curtas. O roteiro é de Kevin Brodbin, que se inpirou no livro “Siege at Jadotville: The Irish Army’s Forgotten Battle”, escrito por Declan Power. Trata-se de uma adaptação para o cinema de um fato histórico ocorrido em 1961, quando a ONU resolver intervir na guerra civil da República do Congo. Os golpistas, depois de assassinarem o então primeiro-ministro Patrice Lumumba, assumiram o poder no país e introduziram no cargo Moise Tshombe, líder da Frende Nacional de Libertação. A força de paz da ONU enviada ao Congo era formada por 150 soldados irlandeses, comandados pelo oficial Pat Quinlan. Detalhe: nenhum desses soldados, em sua maioria jovens, tinha experiência de combate. A base da ONU que ocupavam, na cidade de Jadotville, sofreu um cerco de seis dias pelas tropas da província de Katanga, leais ao governo golpista, treinadas e comandadas por mercenários franceses. É bom lembrar que a França, além de outros países, estava de olho nas riquezas naturais do Congo, entre os quais cobre, urânio, estanho, rádio, diamantes e petróleo. Os valentes soldados irlandeses defenderam heroicamente a sua base e, ao final de seis dias, se renderam por causa da falta de suprimentos e munições, além de alguns feridos em estado grave. Enquanto nos combates morreram cerca de 300 soldados katangeses, os irlandeses não tiveram baixas fatais. Considerando-se a inexperiência do batalhão, foi um feito realmente heroico. O filme mostra toda essa história, preservando o clima tenso e muita ação do começo ao fim, mantendo a atenção do espectador até o desfecho, com sequências de batalha muito bem feitas. O elenco reúne Jamie Dornan (capitão Pat Quinlan), Danny Sapani (Moise Tshombe), Mark Strong (Conor Cruise O’Brien), Mikhel Persbrandt (Dag Hammarskjöld), Guillaume Canet (Rene Faulques), Jason O’Mara (sargento Jack Prendergast), Emmanuelle Seigner (madame La Fontagne) e Fiona Glascott (Carmela Quinlan). Disponível na plataforma Netflix, “O Cerco de Jadotville” é um filme obrigatório para quem curte fatos históricos.     

quinta-feira, 6 de agosto de 2020

   

“CLAIR OBSCUR” (“TEREDDÜT”), 2016, Turquia, 1h45m, roteiro e direção de Yesim Ustaoglu. Excelente drama cujo pano de fundo é a condição da mulher num país onde o machismo impera dentro e fora das quatro paredes. A história é centrada em duas mulheres que vivem situações diferentes, mas que, no fundo, sofrem o mesmo tipo de dilema em seus relacionamentos. A jovem Elmas (Ecem Uzun) é infeliz no casamento. Mora com o marido e a sogra, vivendo praticamente como a empregada da casa. À noite, mesmo sem vontade, é obrigada a se submeter aos desejos sexuais do marido de uma maneira que beira o estupro. Por outro lado, o filme acompanha a rotina diária da psiquiatra Sehnaz (Funda Eryigit), especialista em jovens problemáticos. Ela mora com seu namorado Cem (Mehmet Kurtulus), viciado em vídeos de pornografia na Internet. Quando fica excitado, ele procura Sehnaz. Não é difícil perceber que o relacionamento do casal gira em torno exclusivamente do sexo. Como já era previsível, o roteiro logo unirá as duas mulheres. Elmas acaba de ser presa pelo assassinato do marido e da sogra, mas está em estado de choque e não lembra o que aconteceu. Ela então é encaminhada para os cuidados de Sehnaz, que tentará descobrir o que se passa na mente da moça, assim como desvendar o que a levou a cometer os assassinatos. O roteiro dedica um grande espaço às sessões de Sehnaz com sua nova paciente. Nesse ponto, há que se destacar a excelente atuação das duas atrizes turcas, especialmente a estreante Ecem Uzun. “Clair Obscur” foi lançado no dia 7 de novembro de 2016 durante o Festival Internacional de Cinema de Toronto (Canadá), conquistando público e críticos. O filme recebeu inúmeras premiações mundo afora, como no 32º Festival de Cinema de Varsóvia (Polônia), no Festival de Antálya (Turquia) e no Festival de Haifa (Israel). O filme é excelente, intenso, com um primoroso roteiro que valoriza e esmiúça os relacionamentos sob o ponto de vista da psicologia. Mais um poderoso filme do cinema turco. IMPERDÍVEL!         





segunda-feira, 3 de agosto de 2020


“DEEP WATER” é uma minissérie policial australiana de 2016 com 4 capítulos (cada um com a duração de 50 minutos), direção de Kris Wyld, que assina o roteiro juntamente com Kym Golsworthy. A história foi inspirada nos assassinatos ocorridos em Sidney no final da década de 80 do século passado. As vítimas eram todas homossexuais e os assassinos integrantes de um grupo de jovens violentos e homofóbicos. Em “Deep Water” (a Netflix manteve o título original), os crimes acontecem na praia de Bondy, também em Sidney, um local tradicionalmente frequentado por surfistas. Quando um jovem gay é brutalmente assassinado, a detetive Tori Lustigman (Yael Stone) e seu parceiro Nick Manning (Noah Taylor - tem cara de tudo, menos de policial) iniciam as investigações, no decorrer das quais chegam à conclusão de que o crime pode estar relacionado com os fatos ocorridos em 1989, quando vários homossexuais foram assassinados com o mesmo modus operandi e os mesmos motivos. Diante disso, eles vasculham o passado, interrogando várias pessoas que tiveram alguma relação com aqueles fatos trágicos, entre as quais parentes das vítimas, homossexuais amigos daqueles que morreram e policiais aposentados que investigaram os crimes. Durante essa fase do trabalho, a detetive Tori descobre que seu próprio irmão  surfista e gay também havia sido assassinado naquela época (situação um tanto forçada). O filme acompanha Tori e Nick trabalhando no caso e buscando pistas até chegar ao assassino, cuja identidade só é revelada no desfecho. No gênero policial, a minissérie até que funciona, prendendo a atenção do espectador até o final, mas deixa a desejar no quesito ação. Ou seja, o ritmo é um pouco lento e algumas sequências entediantes. Nada que mereça uma indicação entusiasmada.            

domingo, 2 de agosto de 2020


Se tiver oportunidade, não perca “REDE DE ÓDIO” (“HEJTER”), 2020, Polônia, 2h16m, roteiro de Mateusz Pacewicz e direção de Jan Komasa (“Corpus Christi”, indicado ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2020). Trata-se de um dos filmes mais interessantes e criativos feitos nos últimos anos, além de polêmico e impactante. E, acima de tudo, bastante atual, pois trata dessa praga das fake news, um fenômeno que tem prejudicado muita gente pelo mundo afora. A história é toda centrada no jovem Tomek (Maciej Musialowski), um estudante de Direito que acaba de ser expulso da Universidade de Varsóvia por plágio, ou seja, apresentou um trabalho utilizando um texto que não era seu. Sua trajetória de mentiroso não terminará por aqui. Nas entrevistas de emprego, ele continua mantendo o status de estudante de Direito. Ele consegue finalmente um trabalho numa conceituada empresa de relações-públicas de Varsóvia, na verdade uma empresa de fachada que atua, contratada por clientes importantes, disseminando notícias falsas (fake news) e manchando a reputação de muita gente, principalmente do mundo político, artístico e empresarial. Uma verdadeira praga do mundo moderno. Um dos primeiros trabalhos de Tomek foi inventar maneiras de denegrir a imagem do político Pawel Rodnick (Maciej Stuhr) às vésperas de uma importante eleição. Para conseguir subsídios para montar sua estratégia demolidora contra o político, Tomek se aproxima de uma família importante da sociedade de Varsóvia, grande apoiadora da candidatura de Pawel. É nesse contexto que Pawel mostrará seu lado perverso de manipulador e psicopata digital, colocando em prática toda a sua crueldade virtual em prol do ódio. E não é apenas no mundo virtual que ele destila toda a sua maldade, mas também no mundo real, envolvendo-se emocionalmente com as pessoas e enganando-as com suas performances teatrais. Um perfeito artista do mal, um propagador de ódio.  Sua crueldade chega ao auge quando conhece um fanático extremista nacionalista contrário às ideias do político Pawel, levando o espectador a acreditar que um desfecho trágico está prestes a acontecer. Também fazem parte do ótimo elenco Vanessa Aleksander, Danuta Stenka, Agata Kulesza e Jacek Koman, entre outros atores poloneses da mais alta qualidade. Mas a estrela máxima é realmente Maciej Musialowski no papel de Tomek, um monstro na interpretação de outro monstro. “Rede de Ódio” estreou no Festival Internacional de Cinema de Treblinka (Polônia”), conquistando o prêmio de “Melhor Filme Narrativo Internacional”. O reconhecimento à sua qualidade não parou por aí. Após ser lançado na plataforma Netflix, em 29 de junho de 2020, o filme logo passou a figurar na lista Top 10. A polêmica maior, porém, aconteceria três semanas depois do final das filmagens, quando Pawel Adamowicz, prefeito de Gdansk, seria assassinado em pleno evento público. Por causa disso, o lançamento do filme teve de ser adiado e quase ficou de fora do circuito comercial na Polônia. Resumo da ópera: “Rede de Ódio” é um filme obrigatório, poderoso e impactante. Não duvido que seja indicado para representar a Polônia no Oscar 2021 para disputar o prêmio de “Melhor Filme Estrangeiro”. E com grandes chances de vencer.