sábado, 15 de junho de 2019


“TRAGO COMIGO”, 2016, Brasil, 1h24m, direção de Tata Amaral. Em 2009, Tata Amaral dirigiu uma minissérie produzida pela TV Cultura, em que tratava das memórias dos anos de chumbo da Ditadura Militar. O mesmo tema proporcionou a ideia de se criar um filme, com o mesmo nome e a mesma diretora, mas com uma concepção diferente, um filme/peça teatral dentro de um filme. Ótima ideia, desenvolvida com muita competência pelos roteiristas Thiago Dotori e Willem Dias. Vamos à história: Telmo Marinicov (Carlos Alberto Riccelli, em ótima atuação) é um ex-ator de teatro que militou na luta armada, lá pelo final da década de 60, assaltando bancos e cometendo sequestros e atentados. Depois de preso e exilado, Telmo volta ao Brasil e se consolida como um dos mais importantes diretores de teatro. Numa entrevista que concede a um documentário falando sobre aquela época, Telmo tem um lapso de memória ao ser questionado sobre sua namorada e militante Lia. Ele não consegue lembrar o que aconteceu com ela. Telmo resolve então montar uma peça teatral em que revive os momentos mais marcantes de sua militância. O enredo do filme destaca desde a seleção de atores, jovens e amadores, os ensaios num velho teatro reformado e a dificuldade de Telmo em transmitir o comportamento e a ideologia dos jovens militantes na época dos anos de chumbo. Apesar do contexto dramático, ainda há espaço para boas tiradas de humor. Durante a projeção, o espectador terá a oportunidade de ouvir vários depoimentos emocionados de militantes que foram vítimas da repressão, acabaram presos e submetidos a interrogatórios na base da tortura. O filme se desenrola praticamente num cenário, ou seja, no palco onde a peça é ensaiada. Mesmo assim, não há um minuto de conforto ou monotonia, pois a vitalidade das situações e dos diálogos prende a atenção até o desfecho revelador. Além de Riccelli, estão no elenco, entre outros, Georgina Castro, Selma Egrei, Felipe Rocha, Emílio Di Biasi e Maria Helena Chira. "Trago Comigo" é ótimo, capaz de comprovar que ainda existe vida inteligente no cinema nacional. 

quinta-feira, 13 de junho de 2019


“O ÚLTIMO GOLPE DE MARTELO” (“Le Dernier Coup de Marteau” – a tradução em português é minha, já que o filme não chegou por aqui – nos países de língua inglesa, ganhou o título de “The Last Hammer Blow”), 2014, França, 1h22m, segundo longa-metragem escrito e dirigido pela cineasta francesa Alix Delaporte. A história toda é centrada no adolescente Victor (Romaín Paul), de 13 anos, que vive com a mãe doente Nadia (Clotilde Hesme) num velho e maltratado trailer à beira-mar na periferia pobre da cidade de Montpellier. Victor está dividido entre cuidar da mãe, que tem um câncer terminal, e participar dos treinos de uma equipe de futebol amadora, da qual é um dos atletas de maior destaque. Quando sua mãe desiste de reformar o trailer por não ter dinheiro e comunica a Victor que pretende se mudar para a casa dos pais, em outra cidade, o garoto sai em busca de ajuda do seu pai biológico, o maestro Samuel Rovinski (Grégory Gadebois), regente da Orquestra Sinfônica de Montpellier. Rovinski não sabia da existência do filho e o encontro dos dois reserva ao espectador alguns momentos comoventes e sensíveis do filme, cuja primeira exibição aconteceu no Festival Internacional de Cinema de Veneza, durante o qual Roman Paul recebeu o Prêmio “Marcello Mastroianni” de Melhor Ator Jovem. Para aumentar ainda mais o tom dramático da história, a diretora Delaporte utilizou na trilha sonora trechos da Sinfonia nº 6 em Lá Menor de Gustav Mahler, também conhecida como a "Trágica". Resumo da ópera: o filme é excelente, um drama francês da melhor qualidade. Especial para espectadores que curtem o bom cinema europeu.         

terça-feira, 11 de junho de 2019


“MUSEU” (“MUSEO”), 2018, México, 2h06m, segundo longa-metragem escrito e dirigido por Alonso Ruizpalacios. A história é baseada num fato real ocorrido em dezembro de 1985 na Cidade do México, ou seja, o roubo de 140 peças pré-hispânicas de alto valor histórico do Museu Nacional de Antropologia. O filme acompanha a façanha dos dois ladrões, os estudantes de Veterinária Juan Núñez (Gael García Bernal) e Benjamin Wilson (Leonardo Ortizgris), desde o início do planejamento do roubo, sua execução e depois as tentativas frustradas de vender as peças. No início do filme, a frase “Esta é uma réplica da história original” dá o tom de sátira ao que assistiremos. Embora baseado em fatos reais, o diretor Ruizpalacios trata tudo o que aconteceu com bastante humor, aliviando a carga dramática que poderia se esperar de um acontecimento sério que despertou a revolta de toda a população mexicana. Só para se ter uma ideia do tipo de humor utilizado por Ruizpalacios, numa cena em que Juan e Benjamin são parados na estrada, um dos policiais olha para Juan/Gael García Bernal e pergunta se ele é o famoso ator e pede um autógrafo. Aliás, por falar em Gael García Bernal, o ator está bastante à vontade no papel. Embora não goste muito dele, tenho de concordar que ele está ótimo. “Museu” estreou no 68º Festival Internacional de Cinema de Berlim, em fevereiro de 2018, conquistando o Prêmio de Melhor Roteiro. Por aqui, fez parte da programação oficial da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. “Museu” é mais uma prova da excelente fase do cinema mexicano, que na disputa dos últimos cinco Oscars de Melhor Diretor, venceu quatro, dois para Alejandro G. Iñarritu, um para Guillermo Del Toro e mais um para Alfonso Cuáron, sem falar no Oscar 2019 de Melhor Filme Estrangeiro conquistado por “Roma”.     

segunda-feira, 10 de junho de 2019


 “HISTÓRIAS DE UMA VIDA” (“LE COLLIER ROUGE”), 2018, França, 1h23m, direção do veterano Jean Becker, que também escreveu o roteiro inspirado no romance homônimo de Jean-Christophe Rufin, lançado em 2014. A história, ambientada no verão de 1919, é centrada no soldado Morlac (Nicolas Duvauchelle), herói francês da Primeira Guerra Mundial e agora prisioneiro numa penitenciária da pequena aldeia de Montabron. Ele foi preso por ter cometido um crime contra a pátria, recusando-se a pedir desculpas mesmo correndo o risco de ser fuzilado. O comandante Lantier Du Grezz (François Cluzet), juiz militar, é designado para cuidar do caso, em especial convencer Morlac de pedir perdão, livrando-o da execução.  Quando chega pela primeira vez à prisão, o comandante Lantier vê que há um cão latindo sem parar bem na porta. O pessoal da aldeia esclarece que o cachorro pertence a Morlac, foi com ele para a guerra, participou de algumas batalhas e agora sofre com seu dono preso. Enquanto isso, Lantier segue conversando com Morlac, que conta tudo como aconteceu, inclusive sua paixão por Valentine (Sophie Verbeeck), proprietária de um pequeno sítio onde cria cabras. Em flashbacks, o diretor Jean Becker relembra o início desse romance, a amizade de Morlac com o cão e algumas batalhas durante a guerra. Em resumo, o cachorro terá um papel fundamental na decisão do comandante, assim como Valentine. O filme é bastante simpático, tem o trunfo de ter no elenco três bons atores como François Cluzet, Nicolas Duvauchelle e a bela Sophie Verbeeck. O filme marca o retorno de Jean Becker na direção, lembrando que ele tem no currículo bons filmes como “Um Crime no Paraíso”, “Dois Dias para Esquecer” e o ótimo “Conversas com meu Jardineiro”.    
          

domingo, 9 de junho de 2019


“O AMANTE DUPLO” (“L’AMANT DOUBLE”), 2018, França/Bélgica, 1h47m, roteiro e direção de François Ozon. Trata-se de um suspense inspirado no romance “Lives of the Twins”, da consagrada escritora norte-americana Joyce Carol Oates. A história é centrada em Chloé (Marine Vacth), funcionária de um museu que sofre com dores no estômago. Ela é submetida a uma série de exames clínicos que não detectam qualquer tipo de problema físico. Os médicos, então, a aconselham a procurar um psicólogo. Ela então marca consulta com Paul (o ator belga Jérémie Renier), iniciando uma série de sessões de terapia, durante as quais surge uma atração sexual entre ambos. Quando o romance fica mais sério, Chloé é recomendada a outro psicólogo, Louis (também Renier), irmão gêmeo de Paul. Logo surge também uma atração sexual e Chloé fica dividida entre um e outro, até descobrir segredos sombrios sobre o passado dos irmãos. Paul, por exemplo, foi casado com uma moça chamada Sandra, filha da sra. Schenker (Jacqueline Bisset). Aí o enredo fica ainda mais complexo, depois que Chloé descobre um terrível segredo sobre o seu próprio passado. Enfim, mais um bom suspense de Ozon, cujo estilo lembra muito Hitchcock e Brian De Palma. “O Amante Duplo” é recheado de erotismo e muitas cenas de sexo e nudez, as quais, segundo o crítico de cinema Paulo Villaça, fazem “50 Tons de Cinza” parecer Frozen. Realmente, o erotismo de Ozon beira o explícito. Marine Vacth é linda e ótima atriz. Jérémie Renier, fazendo os dois irmãos, também merece destaque, provando mais uma vez que é um excelente ator. O filme estreou no Festival de Cannes 2018 e causou grande polêmica pelo modo como foi feito, dividindo os críticos. Por aqui, foi uma das atrações da programação oficial do Festival Variux de Cinema Francês, em junho de 2018. O filme é muito bom e ratifica François Ozon como um dos mais importantes cineastas da atualidade (é um dos meus preferidos). Com a assinatura de Ozon, recomendo filmes como “Dentro de Casa” (2013), “Frantz” (2017), “Uma Nova Amiga” (2015), Swimming Pool (2003) e “Jovem e Bela” (2013), este último também com Marine Vacth. É Ozon, portanto, imperdível!