“O
AUTOR” (“EL AUTOR”), 2017, Espanha, produção Netflix, 1h52m,
direção de Manuel Martín Cuenca (“Canibal”), que também assina o roteiro
juntamente com Alejandro Hernández. Na verdade, é um roteiro adaptado, cuja
inspiração veio do livro “O Motivo”, de 2005, escrito por Javier Cercas. Trata-se
de um misto de drama e suspense psicológico, com pitadas de humor negro. A história
é centrada em Álvaro (Javier Gutiérrez), advogado de um cartório quer pretende
ser escritor. Para isso, frequenta as aulas de redação e literatura do
professor Juan (Antonio de La Torre). De início, ela não demonstra muito
talento e, por isso, Juan pega no seu pé, sendo até ofensivo. Mas Álvaro não
desiste. Nem mesmo quando descobre que sua esposa Amanda (María León) anda
pulando a cerca. Durante uma aula, o professor explica para os alunos que é
importante sair às ruas, conversar e interagir com as pessoas, ouvir o que elas
falam. Só assim serão capazes de criar personagens e escrever um livro. Depois que
se separou da esposa, Álvaro passa a morar num prédio e resolve conversar com
todos os vizinhos - e também ouvir o que eles dizem entre quatro paredes. Dessa forma, faz amizade com um casal de imigrantes
mexicanos, com um senhor que vive enaltecendo os tempos do Generalíssimo Franco
e com a síndica do condomínio (Adelfa Calvo). Durante as conversas, Álvaro
acabará se envolvendo com o dia a dia dos moradores. É dessa interação que ele
consegue inspiração para criar seus personagens e construir uma história para compor
seu primeiro romance. Ele leva tão a sério o seu trabalho que muitas vezes costuma
sentar-se para escrever completamente nu, como soube que fazia Ernest Hemingway,
seu ídolo na literatura. Trata-se de mais um excelente, criativo e original
drama espanhol. E, melhor, com uma reviravolta surpreendente no final, transformando
“O Autor” num ótimo entretenimento. Sua estreia mundial aconteceu no Toronto International
Film Festival, em 2017, e logo em seguida conquistou os prêmios Goya 2018 (o
Oscar espanhol) de Melhor Ator (Gutiérrez) e de Melhor Atriz Coadjuvante
(Adelfa Calvo).
sábado, 4 de abril de 2020
sexta-feira, 3 de abril de 2020
“GRAÇAS
A DEUS” (“GRÂCE À DIEU”), 2018, França/Bélgica, 2h17m, roteiro e
direção de François Ozon. Grande vencedor do Prêmio do Júri (“Urso de Prata”)
do Festival Internacional de Cinema de Berlim/2019, o filme consagra o cineasta
francês François Ozon como um dos melhores diretores do cinema atual (leia
algumas dicas de seus filmes no final deste comentário). Inspirado em fatos
ocorridos na França, especificamente na cidade de Lyon, Ozon vai a fundo no
psicológico devastado das vítimas do padre pedófilo Bernard Preynat (Bernard
Verley), que nas décadas de 1980 e 1990 abusou de vários garotos que integravam
um grupo de escoteiros, fatos que viriam a público
muitos anos mais tarde. Alexandre Guérin (Mevil Poupaud), um respeitado
empresário e chefe de família, vítima do padre quando garoto, ficou revoltado
ao ler uma notícia de que Preynat continuava trabalhando com crianças. Com o apoio
da família, ele resolve denunciar o padre ao cardeal Philippe Barbarin (François
Marthouret). Uma psicóloga da paróquia de Lyon promove uma acareação entre Preynat
e Alexandre. O pedófilo confirma os fatos, mas não pede perdão a Alexandre. Além
disso, o cardeal Barbarin firma posição de que tal crime já está prescrito. É a
gota d’água para que Alexandre resolva denunciar publicamente o que aconteceu.
Daí para a frente, várias outras vítimas de Preynat, cujos abusos não podem ser
prescritos, resolvem se posicionar, o que culmina na criação da associação “Palavra
Liberada”. As vítimas resolvem entregar o padre pedófilo à polícia, além de denunciarem
o cardeal Barbarin por omissão. Nesse ponto, o diretor Ozon faz questão de
destacar a burocracia administrativa da Igreja na tomada de uma posição, uma
atitude que denota um forte corporativismo. Embora um tanto verborrágico, o
filme consegue manter um ritmo quase que frenético do começo ao fim, num clima
de forte tensão psicológica. Também fazem parte do elenco Aurélia Petit, Éric
Caravaca, Denis Ménochet, Sinan Arlaud, Josiane Balasco, Hélène Vincente e
Amélie Daure. Para encerrar o comentário, conforme prometido, indico outros
ótimos de François Ozon: “Frantz”, “O Amante Duplo”, “Jovem e Bela”, “Swimming
Pool”, “Uma Nova Amiga” e “Dentro de Casa”, este último, na minha opinião, o
melhor de Ozon. “Graças a Deus” é mais um filme imperdível do diretor francês.
quarta-feira, 1 de abril de 2020
Não é sempre que a gente
descobre uma joia como o criativo e original “UMA MULHER EM GUERRA” (“KUNA
FER I STRÍD”; nos países de língua inglesa, “Woman at War”), 2018,
Islândia, 1h41m, segundo longa-metragem do ator e cineasta islandês Benedikt
Erlingsson. A história é centrada na cinquentona Halla (Halldora
Geirhardsdottir), uma ativista ambiental que resolve sabotar as linhas de energia
nas montanhas de sua região como forma de protesto contra uma fundição de alumínio,
que estaria poluindo os rios e o meio ambiente de seu país. Sua guerra
particular acaba tomando proporções enormes, mobilizando a imprensa do país e suas
autoridades, que iniciam uma verdadeira caçada contra “os terroristas” que querem
destruir a economia da Islândia. Halla tem uma vida dupla, alternando suas
atividades de ativista com a de professora de música. Ela é a respeitável cidadã
responsável pelo coral da terceira idade de sua vila, um disfarce que não
admite erros. Sua perspectiva tende a mudar quando ela recebe uma carta de uma Ong
responsável pela adoção de crianças órfãs originárias de países em conflito. Era
a resposta que ela aguardava há quatro anos: a Ong tinha descoberto uma menina
na Croácia que estava à sua disposição para adoção. Juntamente com essa
novidade, surge em cena Ása (papel da própria Halldora), irmã gêmea de Halla. As
duas devem resolver a questão estratégica da adoção, pois é exigido que Halla
vá à Croácia buscar a criança. Antes disso, porém, Halla quer fazer mais uma
sabotagem, desta vez mais contundente. Em algumas cenas, aqui beirando o
surreal, músicos e cantoras folclóricas acompanham as ações de Halla, um
recurso que lembra os coros de teatro grego. Além de muito movimentado, o filme
reúne gêneros como drama, comédia, política e consciência ambiental. O filme
estreou no Festival de Cannes 2018, sendo indicado para o grande prêmio “Critics’
Week”. Além disso, foi vencedor do 12º Prêmio Lux de Cinema, premiação promovida
pelo Parlamento Europeu. “Uma Mulher em Guerra” também representou a Islândia
no Oscar 2019 como Melhor Filme Internacional. Por aqui, chegou a ser exibido
durante a programação oficial da 42ª Mostra Internacional de Cinema de São
Paulo, em outubro de 2018. A atriz e diretora norte-americana Jodie Foster gostou
tanto do filme islandês que já está filmando um remake nos Estados Unidos. Enfim, “Uma
Mulher em Guerra” é um filme genial, uma verdadeira pérola do cinema mundial.
IMPERDÍVEL com letras maiúsculas!
“A TRINCHEIRA INFINITA” (“La
Trinchera Infinita”), 2019, Espanha, 2h27m, produção e distribuição
Netflix, direção de Jon Garaño e Aitor Arregi, seguindo roteiro assinado por
Luiso Berdejo e Jose Maria Goenaga. A história, baseada em fatos reais, tem
como pano de fundo a situação política da Espanha desde o início da Guerra
Civil Espanhola (1936-1939), passando pela Segunda Guerra Mundial e o período
posterior em que o Generalíssimo Franco governou o país com mãos de ferro. Na
verdade, o enredo vai até 1969. É uma história incrível, toda ambientada num
vilarejo do interior da Espanha. No início da Guerra Civil, houve uma grande
caçada aos comunistas. Um deles era Higinio Blanco (Antonio de la Torre), que
passou a ser procurado como inimigo número 1 pela polícia local. Com o cerco ao
vilarejo, impedindo qualquer fuga, Higinio resolve se esconder num porão da
casa, ajudado pela esposa Rosa (Belén Cuesta). Esse confinamento só terminaria
em 1969, acredite se quiser. Nesse longo período de 33 anos, Higinio também
ficaria escondido na casa de seu pai, num quarto construído especialmente para
se transformar em esconderijo. Enquanto Rosa costurava e consertava roupas para
o pessoal da vila, Higinio só tinha contato com o mundo exterior apenas através
de um buraco na parede, devidamente disfarçado atrás de um espelho. Mesmo em
1963, quando Franco decretou a anista ao pessoal envolvido em questões
políticas, Higinio decidiu não sair da toca. Para destacar ainda mais a sensação
de claustrofobia dos dois personagens, a fotografia foi realizada em tons
escuros até quase o desfecho. Eu já conhecia Antonio de la Torre e Belén Cuesta
de outros carnavais, ou melhor, de outros bons filmes. Dele, eu já tinha
assistido, entre outros filmes, o espetacular “O Candidato” (“El Reino”) e “Que
Dios nos Perdone”. Dela, lembro da recente comédia “O Outro Pai” e “Kiki: Os Segredos
do Desejo”. Juntos agora em “A Trincheira Infinita”, os dois esbanjam
competência. O filme foi lançado na plataforma Netflix no dia 28 de fevereiro
de 2020, mas antes foi exibido no Festival Internacional de San Sebastian 2019,
onde ganhou os prêmios de Melhor Diretor e Melhor Roteiro. Disputou também o
Goya (o Oscar espanhol), conquistando os prêmios de Melhor Atriz (Cuesta) e de
Melhor Som. Excelente!
terça-feira, 31 de março de 2020
“JUSTIÇA EM CHAMAS” (“TRIAL BY
FIRE”), 2019, Estados Unidos, 2h7m, direção de Edward Zwicz, com
roteiro de Geoffrey Fletcher, adaptado do livro “Trial by Fire”, escrito por
David Grann. O filme relembra um caso de grande repercussão nos Estados Unidos,
que tem como pano de fundo os prós e contras envolvendo a pena de morte. No
caso, os contras. A história, baseada em fatos reais, é toda centrada em
Cameron Todd Willingham (Jack O’Connell), que, em 1991, foi preso acusado de
provocar o incêndio que resultou na morte de suas três filhas, duas das quais
gêmeas. Ele foi julgado e condenado à morte por injeção letal (o fato aconteceu
no Texas). Alguns anos antes da execução, Elizabeth Gilbert (Laura Dern), uma
dona de casa viúva, passou a enviar cartas a Cameron e até agendou uma visita ao
presidiário. Depois de inúmeras cartas trocadas e outras tantas visitas,
Elizabeth ficou obcecada pelo fato de que o inquérito tinha várias falhas e resolveu
contratar um advogado para entrar com recurso para rever os detalhes do
julgamento. Não conseguiu reverter a situação de Cameron, que foi executado em
2004. Poucos anos depois, uma matéria investigativa publicada pela tradicional
revista “The New Yorker” revelava estudos científicos que provaram ser Cameron
inocente da acusação. O filme revela em detalhes os bastidores de toda a história,
com um roteiro bem engendrado por Geoffrey Fletcher, que já havia conquistado
um Oscar de Melhor Roteiro Adaptado por “Preciosa – Uma História de Esperança”
(2010). O currículo invejável do diretor Edward Zwicz também é um bom aval de
qualidade: “Jack Reacher: Sem Retorno”, “O Dono do Jogo”, “Amor e Outras Drogas”,
“Um Ato de Liberdade”, “Diamante de Sangue” e “O Último Samurai”. Resumo da
ópera: “Justiça em Chamas” é um bom entretenimento, valorizado pelas atuações
da sempre ótima Laura Dern e do ator inglês Jack O’Connell.
segunda-feira, 30 de março de 2020
“O INFORMANTE” (“THE INFORMER”), 2019,
EUA, 1h53m. Todo mundo que trabalhou no filme é de um país diferente,
transformando a produção numa verdadeira ONU. O diretor Andrea Di Stefano é
italiano; os roteiristas Anders Roslund e Borge Hellstrom são suecos; o ator
principal, Joel Kinnaman, é sueco radicado nos Estados Unidos; Rosamund Pike e
Clive Owen são ingleses; e Ana de Armas é uma atriz cubana radicada nos EUA. Claro
que essa diversidade não prejudicou o filme, pois é todo mundo muito competente. Toda a história é centrada em Pete
Koslow (Kinnaman), ex-soldado da equipe de Operações Especiais do exército norte-americano, um
briguento que cumpre pena depois de espancar e matar um sujeito em defesa de
Sofia (Ana de Armas), sua esposa. Em troca da redução da pena, ele é cooptado
pelos agentes do FBI Wilsox (Pike) e Montgomery (Owen) para se infiltrar numa
gangue da máfia polonesa chefiada por um tal de “General”, que estava dominando
o tráfico de drogas em Nova Iorque. A missão de Koslow não é nada fácil: ser
enviado para uma prisão de segurança máxima onde o pessoal do “General” mandava
e desmandava. Para isso, teria proteção total do FBI e do próprio diretor da
prisão. Para encurtar a história e não revelar detalhes, destaco apenas que
Koslow vai comer o pão que o diabo amassou, pois será perseguido não só pelo
pessoal da gangue polonesa, mas também pela polícia novaiorquina e pelo próprio
FBI, que havia lhe prometido proteção. Como filme de ação, funciona
perfeitamente, garantindo momentos de muita tensão, suspense e pancadarias.
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